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E05T01 Marketing Explicado – A Psicologia das Cores é um mito

E05T01 Marketing Explicado – A Psicologia das Cores é um mito

E05T01 Marketing Explicado – A Psicologia das Cores é um mito

Psicologia das Cores. Tanto para dizer sobre um assunto tão insignificante e profundamente errado. Primeiramente, uma declaração sobre a premissa deste episódio para depois não dizeres que não estavas à espera: a Psicologia das Cores é um mito.

Neste episódio, vamos falar sobre a pseudo-teoria da Psicologia das Cores como um símbolo de todas as ideias feitas e mitos que assombram o Marketing. Acredita, não são poucos, são muitas vezes ignorados e, sobretudo, têm um impacto negativo incalculável no progresso. Se fores designer ou marketer, basta pensares quantas vezes alguém recusou um trabalho teu porque a cor utilizada não correspondia à mensagem subliminar que se queria comunicar. Seja lá o que isso for.

Se estás envolvido em processos de branding, já não deves ter a mínima paciência para construir logótipos azuis, todos igualmente chatos e ineficazes, incapazes de cumprir o seu propósito: diferenciar a marca das suas concorrentes. Imagina o potencial que se perde cada vez que é criado mais um logótipo azul. Imagina a diversidade e a criatividade que se perdem cada vez que uma cor é excluída de um produto, de um packaging ou de um cartaz devido a um suposto significado oculto. É triste, mas acontece.

Para facilitar o argumento, vamos focar a atenção na Psicologia das Cores e vamos tentar descascar o tema até não sobrar nada. 

Como surgiu o estudo das cores?

O estudo das cores é algo que podemos encontrar desde que existem registos da actividade humana. Desde a arte rupestre da pré-história que os humanos utilizam cores para representar diversos fenómenos. No Antigo Egipto, acreditava-se que as cores tinham diferentes significados e que poderiam ser utilizadas para tratamentos holísticos e invocações espirituais. A associação do preto à morte e ao luto surgiu nesta época. 

Ao longo dos séculos, a utilização e interpretação das cores foi evoluindo à medida que as sociedades necessitavam de representar simbolicamente novos fenómenos e ideias. Assim, encontramos cores associadas a movimentos políticos e religiosos, como o vermelho no regime nazi e o púrpura na igreja católica. A estilos de vida, como o verde escocês presente nos kilts. À moda, aos estados de espírito e, de maneira idêntica, ao marketing e publicidade. 

No entanto, foi apenas a partir de 1665, quando Isaac Newton descobriu o espectro da cor, que o espiritualismo deu lugar à ciência e se começou a saber mais sobre este fenómeno tão curioso. Afinal, a cor é apenas a decomposição da luz.

O estudo da cor enquanto elemento capaz de influenciar a mente humana terá começado com Carl Jung, um psiquiatra Suíço que viveu entre 1875 e 1961, colega de Sigmund Freud. O interesse académico de Jung relacionava-se, sobretudo, com as propriedades e significados das cores e o seu potencial nas artes e na psicoterapia. Concorde-se ou não com os resultados do seu trabalho e com os métodos pouco ortodoxos das suas pesquisas, é importante, antes de mais nada, reconhecer e valorizar o espírito científico que o animava. Algo desconhecido para os pseudo-intelectuais que, posteriormente, viriam a inspirar-se vagamente no seu trabalho para criar ideias altamente simplistas sobre a influência das cores no comportamento humano.

O que é a Psicologia das Cores?

Nem sei bem se a Psicologia das Cores pode ser considerada uma teoria científica, nem qual o crédito que a Psicologia moderna lhe confere, mas o Marketing e a Comunicação idolatram este tipo de regras universais. Correndo o risco de cometer uma imprecisão, vou chamar-lhe estudo para facilitar o discurso. 

A Psicologia das Cores é, então, o estudo da reacção do cérebro humano aos estímulos provocados pela exposição às cores. Um estímulo provoca uma reacção neurológica que é descodificada pelo cérebro numa emoção ou sensação. Posteriormente, recolhe-se essa informação e utiliza-se para categorizar as cores e atribuir-lhes significados. Parece científico não é? Já lá vamos…

O modelo tradicional da Psicologia das Cores assenta em seis princípios básicos:

  1. As cores podem ter um significado específico;
  2. A aprendizagem ou as reacções biológicas inatas podem estar na base do significado das cores;
  3. A percepção de uma cor desencadeia uma avaliação automática;
  4. O processo de avaliação força a um comportamento motivado pela cor;
  5. A cor exerce a sua influência de forma automática;
  6. O significado da cor e os seus efeitos são influenciados pelo contexto.

Qual a aplicação prática da Psicologia das Cores no Marketing?

Eu percebo a tentação de basear o Marketing neste tipo de teorias. Afinal, não temos teorias próprias para suportar o nosso trabalho. E até percebo que, em contexto empresarial, se simplifiquem os estudos teóricos e se criem frameworks de trabalho. O que não consigo compreender, nem posso aceitar, é que a teoria se transforme em crença e se utilize de forma indiscriminada e sem escrutínio. De atitude científica passamos a pura e simples preguiça. 

Alguns marketers preguiçosos começaram por simplificar ao extremo a Psicologia das Cores, reduzindo uma área com séculos de estudo a uma matriz que permite decidir, em segundos, se uma cor serve ou não para uma campanha de comunicação. «Pois, isso é azul, mas nós queremos comunicar qualidade.» E então? Não há coisas azuis com qualidade? Surreal.

Uma teoria como a Psicologia das Cores tem um potencial tremendo para ajudar o Marketing na sua incrivelmente difícil tarefa de compreender e influenciar o comportamento humano. Actualmente, existem até alguns equipamentos e processos científicos para estudar a fundo este tipo de temas. O tão famoso quanto inexplorado Neuromarketing. Mas os estudos são caros e demorados e não existe grande incentivo económico para os fazer, pois o seu resultado é facilmente replicável. Então, caímos no campo da superstição. 

Uma profecia que se auto-concretiza

Em conclusão, a Psicologia das Cores aplicada ao Marketing é uma profecia que se auto-concretiza. Durante décadas, a indústria que produz tudo aquilo que consumimos tem recorrido a agências de comunicação para desenvolverem a sua publicidade. Estas agências, sobretudo, tendem a seguir o mesmo playbook. Assim sendo, fazem mais ou menos as mesmas coisas. Acreditam mais ou menos nas mesmas premissas. Recrutam novos colaboradores a partir de um círculo fechado de pessoas que pensam da mesma forma. Não deixa de ser um paradoxo que não abunde diversidade numa actividade que pretende ser criativa.

Como resultado, desenvolve-se e comunica-se mais ou menos da mesma maneira tudo o que consumimos e todos os conteúdos que nos impactam. A própria Psicologia das Cores é ensinada nas Univerdades, tendo-se tornado no código implícito da maioria dos profissionais, independentemente se ser correcta ou não. Está criado o ambiente que nos força a assumir um conjunto de ideias socialmente construídas.

Durante toda a nossa vida, é-nos ensinado que o preto deve ser utilizado nos funerais, que as noivas devem vestir branco, que a calma do oceano e o prometido descanso eterno no céu são azuis. Quando alguém nos quer recompensar dá-nos algo doce que nos vai saber bem, como um chocolate, que é castanho. E assim, de experiência em experiência, vamos aprendendo que as cores têm significados e transitando essa informação para outras partes da nossa vida. 

Não deixa de ser curioso que, na matérias dos direitos sociais, sejamos tão activos na tentativa de erradicar as ideias sexistas, racistas e homofóbicas relacionadas com as cores, como a existência de certas cores para rapazes e de outras para raparigas, mas que nos negócios sejamos os primeiros a ancorar cores aos significados que nos interessam.

Psicologia das Cores, uma teoria que se auto-anula

Lembras-te dos seis princípios base da Psicologia das Cores? Reparaste como a teoria se anula a ela própria?

Não há dúvida de que as cores podem ser associadas a significados, assim como tudo o que existe à nossa volta. O que são estas palavras senão meros símbolos aos quais atribuimos significados? Também não resta dúvida de que os significados que atribuimos a cada cor podem motivar um emoção e desencadear uma acção. Basta, por exemplo, pensar no contexto desportivo quando o mero avistamento da cor do clube rival desperta sentimentos quase animalescos. Mas será isso algo universal? É óbvio que não. É evidente que o significado das cores é aprendido e socialmente construído.

Uma cor que pode significar morte numa parte do mundo, ou numa determinada época da história, pode, ao mesmo tempo, significar vida noutra completamente diferente. Digo mais, os significados das cores e a sua capacidade de desencadear uma reacção variam totalmente de indivíduo para indivíduo. Há até estudos que o comprovam com experiências em gémeos. Então como ousam os preguiçosos do Marketing ensinar nas Universidades que utilizar azul no logótipo vai transmitir uma imagem de confiança? Estamos no reino da fantasia e da crença, não do empírico e do científico.

Não há certo nem errado

Outro pormenor que me fascina na Psicologia das Cores é o facto de não haver certo nem errado. Os gurus do Marketing vendem a teoria afirmando as suas capacidades de influenciar os resultados de uma campanha e de fazer a diferença no sucesso de uma marca, mas não dizem, afinal, quais as cores que se podem ou não usar. Basta olhar para qualquer infográfico que circule na internet sobre este tema e rapidamente se percebe que todas as cores são boas e prometem apenas aspectos positivos para as marcas. 

  • O amarelo é optimismo;
  • O laranja é amigável;
  • O vermelho é excitação;
  • O roxo é criativo;
  • O azul é confiança;
  • O verde é pacífico;
  • O branco é equilíbrio.

O branco é equilíbrio? O logo da Apple é branco e a sua missão é disromper o mundo!

Será que estes efeitos são cumulativos? Nesse sentido, mais vale fazer como a Google e utilizar as cores todas. 

Se todas as cores estão certas, para que serve esta teoria? Qual destas cores me vai ajudar a vender mais? De que cor devem ser os botões do meu site? Inegavelmente, se eu te fizer acreditar que botões roxos geram mais resultados e tu os utilizares no teu website, o consumidor que quiser mesmo comprar o teu produto não vai deixar de o fazer por causa desse pormenor. Tu vendes e eu ganho uma teoria comprovada que, com sorte, se vai espalhar pelo mercado e validar a si mesma. Não importa se isso é científico, desde que tenhamos fé.

É tudo uma questão de contexto

Creio que já percebeste que não acredito na Psicologia das Cores ou, sobretudo, na interpretação simplista que o Marketing adora utilizar. Em primeiro lugar, acho que se pode ser premium sem utilizar preto ou dourado, acho que se pode comunicar em saúde sem ter medo do vermelho. Em seguida, acho que não faz falta ao universo mais uma empresa de consultoria com cor azul. Por fim, sei que o sucesso destas opiniões depende apenas do talento do designer que as executar.

Por certo, esta minha reflexão inflamada não tem em consideração algo muito importante: o contexto. E é aqui que reside a mestria do Marketing: na capacidade de conhecer e interpretar a sua audiência, sem partir de juízos de valor infundados e ultrapassados. Em teoria, qualquer cor pode ser utilizada em qualquer contexto. Na prática, teremos mais sucesso se soubermos interpretar o ambiente e as superstições da nossa audiência e se conseguirmos utilizar esse conhecimento a nosso favor. Se queres comunicar para uma audiência de adeptos de um clube, em princípio não vais usar a cor do clube rival. É tudo uma questão de contexto.

Mais design, menos psicologia subliminar

Talvez seja mais produtivo para o Marketing abordar o tema da cor do ponto de vista do design. Procurar a harmonia, tentar melhorar a estética, facilitar a usabilidade. Mais do que tentar influenciar os cliques através de truques com botões de cores específicas, tentar criar uma experiência imersiva para o utilizador, guiá-lo através de uma comunicação coerente e, sobretudo, honesta. Não há mal nenhum se a marca for roxa ou laranja, desde que a escolha seja consciente e estruturada. 

Em suma, quando começarmos a abordar a cor com a perspectiva da estética, e não da psicologia subliminar, vamos descobrir que existe um admirável mundo novo das cores, que há muitas mais oportunidades para além do verde e do azul e que o futuro está nas combinações improváveis que a nossa criatividade conseguir criar. 


E05T01 Marketing Explicado, um podcast da The Agency, publicado a 12 de Fevereiro de 2021, disponível em:

Acompanha todos os episódios de Marketing Explicado:

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